sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Gente com muito curriculum....


O que não falta por ai, é gente a dar palpites. Senhores professores, doutores e engenheiros, mestres em dizer o que há a fazer. Mestres em identificar todos os males do país. Mestres em apresentar soluções que afinal ninguém põe em pratica, ou quando põe, se mostram ruinosas. Gente com muito currículo, formada em universidades estrangeiras, mestrados noutras universidades ainda mais conceituadas, doutorados no top five mundial. Ocupam posições de destaque em bancos e empresas de reputação internacional. Tudo do melhor que pode haver.
Em minha opinião só tem uma lacuna, coisinha sem importância, desconhecem por completo o país que lhes dá tempo de antena para darem palpites. Quando é que esta gente sai à rua e tenta perceber a realidade em que vivem os seus concidadãos? Quando é que saem sem motorista ou sem batedores da policia, para tentarem perceber as dificuldades reais de locomoção com que todos os dias somos confrontados? Quando é que esta gente tenta conviver, com a realidade que é o nosso país, onde a grande maioria conta os tostões todos os meses para poder chegar ao fim do mês com as refeições em dia?
É fácil estar sentado numa secretária, em ambiente climatizado, analisando  números e actualizando os seus conhecimentos através da imprensa internacional. Difícil é ter que dizer aos filhos que não se pode comprar, porque o dinheiro não chega nem para comer, quanto mais para pagar a conta de Internet!
Tenho tido o privilégio, de trabalhar noutros países. Tenho tido a possibilidade de passar férias fora de Portugal. E posso-vos garantir que a ideia com que ficamos das realidades locais são bem diferentes. Já estive de férias em locais onde também já estive em trabalho. Uma coisa não tem nada a ver com outra!
Quando estamos de férias até podemos ter a percepção do que se passa à nossa volta. Mas uma coisa é ter a percepção, outra coisa é ter que viver essa mesma realidade.
Numa das viagens que fiz em trabalho, fui confrontado com algo que me aborreceu nos dois primeiros dias da minha estadia. Quando eu voltava do almoço, as pessoas a que comigo trabalhavam de manhã, não apareciam ou estavam meio “adormecidas” da parte da tarde, o que tornava as tardes muito pouco ou nada produtivas. No primeiro dia vi, não gostei mas não me manifestei. Ao segundo dia, percebi que aquele iria ser o “ritual”, achando descabido, falei com o responsável local. Em meu entender estavam-se a desperdiçar recursos financeiros sem o aproveitamento que seria desejável, eu estava lá, disponível, podendo ajudar muito, e só estava a ajudar um bocadinho.
A resposta mudou a minha forma de ver a vida! As pessoas que “desapareciam” a seguir ao meu almoço, faziam-no porque o corpo não dava para mais. Acordavam ás cinco da manhã, caso tivessem conseguido dormir por causa do mau tempo. Eu acordava pouco antes das oito, bem dormido, num quarto de hotel, com todas as mordomias ao meu dispor. Tomavam a única refeição do dia com sol, dependendo do que tinham conseguido arranjar no dia anterior. Eu tomava um pequeno almoço muito bom, onde não faltava nada. Para chegarem ao local de trabalho, caminhavam em média três horas. O meu motorista, chegava pontualmente à hora marcada, para me conduzir durante cinco minutos, em ambiente climatizado, pois às nove da manhã o calor que já se fazia sentir “punha-me” a transpirar ao mínimo esforço. Pouco depois do meio dia eu ia almoçar, sempre aos melhores restaurantes da cidade. Mas os meus “colegas” não, permaneciam nas instalações. Tentando gastar o mínimo das energias possíveis, porque o que tinham abastecido de manhã, tinha que dar até à noite, quando chegassem a casa, depois de caminharem o percurso de volta, onde iriam comer o que houvesse disponível.
Como é que eu iria poder “exigir” daquela gente que desse o mesmo rendimento que eu, quando as realidades eram tão distintas? A partir do terceiro dia no meu pequeno almoço e mesmo ao almoço, providenciei alguns viveres para poder alimentar aqueles que até queriam, mas em virtude das carências, não podiam ter a disponibilidade que eu achava adequada.
Se eu me tivesse limitado a criticar, se não tivesse “vivido” e entendido a realidade local, ninguém iria ficar a lucrar. Eles teriam gasto uma boa maquia, que não teria o proveito que era pretendido. Eu teria saído do país em causa com a sensação que o meu conhecimento não tinha sido rentabilizado ao máximo, que poderia ter feito muito mais!
Não foi isso que aconteceu, adorei trabalhar com pessoas, que embora muito modestas e com muitas carências, dão tudo o que tem para dar.
É esta falta de entendimento e de vivências, que em minha opinião, falta aos senhores que mandam “postas de pescada” e acabam por decidir, sentados em gabinetes, lendo o New York Times, mas que não fazem a mínima ideia de como se vive em S. Martinho das Amoreiras ou em Moimenta da Beira.
Para que serve um posto médico completamente equipado, se falta o principal: o médico?    

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